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Exemplo de artigo

Configuração dos alunos no espaço social (Análise de Componentes Principais)

 

Para uma apreensão mais integrada do que até agora se tem dito seleccionaram-se, para projectar num espaço multidimensional, variáveis indicativas do perfil das famílias, suas expectativas, práticas relativas à escolaridade dos filhos e reprovações dos alunos. No sentido de localizar no espaço social os três grupos em análise introduziu-se como suplementar a variável “ascendência”.

Com o conjunto de variáveis utilizadas as duas primeiras dimensões extraídas explicam 53,5% da variação existente na população inquirida, mais a primeira (inércia=0,336) do que a segunda (inércia=0,199). Com esta solução registaram-se medidas de discriminação por vezes baixas em algumas das variáveis optando-se por mantê-las dada a relevância teórica. Registaram-se ainda variáveis com medidas de discriminação elevadas em ambas as dimensões, o que traduz uma homogeneidade entre as variáveis de input e inviabiliza que se possam considerar as dimensões como eixos temáticos distintos. Investiu-se então na interpretação ao nível das categorias e dos objectos.

 

A dimensão 1 reflecte uma associação entre categorias que apontam para situações de desprivilégio social – como sejam as classes populares, a desqualificação escolar, deficiências no domínio da língua portuguesa –, bem como a ausência de contacto com a escola e baixas expectativas escolares por parte dos pais, isto aliado a situações de reprovações. Em oposição surgem as categorias que indicam situações de privilégio social, elevado investimento escolar por parte dos pais e elevadas expectativas, bem como sucesso escolar.

 

A dimensão 2 diferencia os alunos quanto ao modelo familiar e à sua relação com as normas escolares, opondo os que vivem simultaneamente com o pai e a mãe e apresentam atitudes de conformidade com as normas escolares aos restantes.                                     

   

Olhando agora para a representação gráfica torna-se evidente a oposição entre o 1º e 3º quadrantes ao nível do número de reprovações. No 1º quadrante surgem as situações de não reprovação, próximas quer dos alunos descendentes de indianos que dos alunos autóctones e no 3º quadrante surgem as situações de pelo menos uma reprovação, onde estão também representados os alunos descendentes de cabo-verdianos. Interessante é constatar que essa proximidade ao nível do desempenho escolar não tem paralelo ao nível das condições sociais. Se os autóctones estão próximos de pais com elevadas habilitações literárias e expectativas escolares, já os descendentes de indianos se aproximam de pais com baixas qualificações escolares e moderadas expectativas quanto ao percurso escolar dos seus filhos.

Na dimensão 2 sobressai o afastamento dos alunos descendentes de cabo-verdianos relativamente aos descendentes de indianos no que concerne ao modelo familiar e à atitude de conformidade com as normas escolares. Os primeiros estão privilegiadamente associados a modelos familiares de monoparentalidade ou de famílias reconstituídas e a uma relação moderada, ou mesmo de rejeição, com as normas vigentes na escola. 

Torna-se também relevante constatar a associação dos três grupos a diferentes classes sociais dos pais. Os alunos descendentes de cabo-verdianos partilham o quadrante com a classe operária, os autóctones estão sobretudo cerca dos empresários, dirigentes e profissionais liberais e os alunos descendentes de indianos aproximam-se dos trabalhadores independentes, trabalhadores independentes pluriactivos e ainda dos assalariados executantes pluriactivos.  

O plano anterior evidencia configurações bem definidas, reflectindo a existência de três perfis de alunos, clarificando e tornando mais óbvia a situação de desprivilégio dos alunos descendentes de cabo-verdianos.

 

 

Localização dos alunos no espaço social (regressão linear múltipla: método Enter)

 

 

Na representação gráfica anterior podemos visualizar a distribuição dos objectos no espaço social anteriormente caracterizado. Verifica-se que os 4º e 3º quadrantes, aqueles que respectivamente representam a situação de maior e menor privilégio social, são os que concentram menos alunos. Confirma-se assim o que já tinha sido identificado aquando da distribuição das categorias no espaço social relativamente à predominância de alunos autóctones (“pt”) nas condições de favorecimento social e de alunos descendentes de cabo-verdianos junto de categorias que remetem para condições sociais opostas. A maior parte dos alunos inquiridos situa-se nos 1º e 2º quadrantes, onde se localizam as categorias intermédias em termos sociais e a ausência de reprovações. No caso específico dos alunos descendentes de indianos imporá salientar a sua concentração junto quer do desprivilégio social quer de situações de não reprovação.7. Factores explicativos do número de reprovações

Com o intuito de explicar o número de reprovações dos alunos nos três grupos considerados realizou-se uma regressão linear múltipla para cada um deles. Nos três exercícios optou-se por introduzir, como variáveis preditoras, o mesmo conjunto de variáveis, uma vez que se pretendia identificar as diferenças nas condicionantes do (in)sucesso escolar dos alunos. O modelo é composto por variáveis sócio-demográficas (classe social[1] e escolaridade dos pais), variáveis que medem a relação dos pais com a língua portuguesa (domínio da língua portuguesa[2] e língua falada em casa[3]), variáveis que reportam ao investimento escolar dos pais (frequência de reuniões escolares[4], controlo dos TPC[5] e existência de diálogo em casa sobre a escola[6]) e uma variável composta que mede a relação dos alunos com as normas escolares[7].

 

 

Quadro 4. As condicionantes da performance escolar

(regressão linear múltipla: método Enter)

 

O modelo utilizado, estatisticamente significativo em todos os grupos (descendentes de indianos F=3,377; p<0,05; descendentes de cabo-verdianos F=0,279, p<0,05; autóctones F=0,257, p<0,001), explica cerca de 28% da variância do número de reprovações no caso dos descendentes de imigrantes e um pouco menos (25,7%) nos alunos autóctones. Neste último modelo foi automaticamente removida a variável “língua falada em casa”, uma vez que todos os casos se encontravam, como seria de esperar, representados na mesma categoria da resposta (“só fala português/fala português e outras línguas”). 

Começando pelos alunos de ascendência indiana verificou-se que são o domínio da língua portuguesa por parte dos pais (Beta=0,031, p<0,05), a língua falada em casa (Beta=0,219, p<0,05) e a relação dos alunos com as normas escolares (Beta=0,321, p<0,05) que mais contribuem para explicar o nível de sucesso ou insucesso escolar dos alunos. Ou seja, uma maior proximidade com a língua portuguesa e uma maior conformidade com as normas escolares estão relacionadas significativamente com um menor número de reprovações. Das variáveis anteriormente referidas as que mais contribuem para explicar a variação do número de reprovações são o grau de conformidade às normas escolares e a língua falada em casa.

Já nos alunos descendentes de cabo-verdianos a proximidade com a língua portuguesa não se revela significativa, enquanto que a maior conformidade com as normas (Beta=0,404, p<0,05) permanece como variável explicativa. A relevância da atitude perante a disciplina escolar é evidente, quer pela exclusividade do estatuto de estatisticamente significativa, quer pelo elevado valor de Beta, quando comparado com os restantes grupos.

Relativamente aos alunos autóctones, para além da maior conformidade com as normas (Beta=0,345, p<0,001), uma maior escolaridade do pai (Beta=-0,188, p<0,05) e a frequência de reuniões escolares (Beta=-0,117, p<0,05) influenciam o menor número de reprovações.

Conclui-se pois que apenas no caso dos alunos autóctones as variáveis de caracterização socio-demográfica (especificamente a escolaridade do pai) e de investimento escolar por parte da família, geralmente avançadas como as principais responsáveis pelo (in)sucesso escolar dos alunos, surgem como estatisticamente significativas. Já no caso do grau de conformidade com as normas escolares a sua significância em qualquer um dos grupos poderá prender-se com o facto de esta ter uma relação ambígua em termos de independência com o número de reprovações.

Os resultados desta análise devem porém ser lidos com reservas, uma vez que alguns dos pressupostos necessários à realização deste exercício não foram cumpridos[8], nomeadamente a linearidade do fenómeno em estudo, a homocedastecidade e a normalidade da distribuição das variáveis, o que estará relacionado com a insuficiente dispersão dos valores da variável dependente, fortemente concentrados em torno de 0 e 1. Ainda assim optou-se por manter o exercício, uma vez que nos propusemos, neste estudo, encontrar explicações para a variação do número de reprovações, não encontrando outra variável que pudesse servir como alternativa. Cumpre ainda referir que se realizou o exercício retirando os outliers, mas a situação de incumprimento dos pressupostos manteve-se, pelo que se optou por mantê-los.

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